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Ucrânia
Здравствуйте
Correspondência latina: Zdravstvuyte
Pronúncia fonética: zdrávst-vui
Língua: Russo (da Ucrânia)
Significado: Saúde para ti
 
O mesmo punhal cria em cada músculo uma ferida diferente. O mesmo corte cicatriza de modo distinto em cada corpo. Para uns, a recordação de uma dor é sal que reacende a ferida. Para outros, essa memória é um bálsamo no endurance da maratona, um certificado de prova superada com orgulho. Been there, done that! Portuguesa quase por inteiro, Alina é uma miúda nova, feliz, sem mácula traumática. Deve essa serenidade à mãe, Olena, que traz no corpo a genética social do comunismo soviético e cicatrizes de que nem sempre se lembra… Umas são mais visíveis que outras. Todas fizeram dela uma resistente. 
     
Olena Mishtur
Natural de Zaparóshe, na Ucrânia soviética
44 anos

Olena Mishtur está tão focada em deixar clara a satisfação que sente por viver em Portugal que quase se esquece de nos contar a história de alguns dos momentos mais difíceis que viveu na Ucrânia, ainda antes da dissolução da URSS. Fala com um brilho especial, aquele que envolve quem não consegue conter a alegria implícita numa particular superação e começa por explicar que foi educada no comunismo e no cristianismo protestante, ambos com regras muito rígidas logo desde a infância. “Tinha que usar sempre saia comprida, não podia cortar o cabelo nem furar as orelhas, não podia usar maquilhagem nem verniz nas unhas, e o pior de tudo é que não podíamos ter amigos fora da nossa religião”, sintetiza, num Português em que apenas determinadas palavras denunciam um sotaque de Leste. “Só aos 19 anos é que tínhamos direito a comentar o que achávamos bem ou mal e, para se ter uma noção, se alguém fosse apanhado bêbedo na rua ficava três dias na prisão, sem julgamento e sem nada, e isso era o mínimo que lhe podia acontecer”. Conduta religiosa e legislação civil confundiam-se, mas Olena só retirou de uma e outra as melhores lições, e esclarece: “Muita gente pensa o pior do comunismo, mas eu não concordo. Agora, nesta idade, consigo fazer uma comparação com os países totalmente liberais e acho que, infelizmente, a sociedade perde-se um bocadinho quando não há regras. Não é bem que cada um vá fazer o que quiser, mas as pessoas são menos responsáveis e eu vejo muita juventude perdida por causa disso. O comunismo obrigava as pessoas a seguirem regras e isso também lhes dava oportunidade de serem melhores”.

Apostada numa constante evolução pessoal, essa filosofia explicará o empenho que a família Mishtur aplicava na educação: numa era em que todas as casas tinham um piano, Olena começou por ter aulas com a avó aos três anos, aos 10 já integrava o coro da igreja porque a família acreditava que devia “pôr esse talento ao serviço de Deus”, aos 13 tornava-se a organista principal do templo e aos 15 era maestrina de um coro com mais de 100 pessoas. Estava “totalmente programada para desenvolver tudo o que fosse preciso em música” e o Conservatório de Kiev foi a última etapa num processo de formação que logo a levou a dar aulas na Escola N.º 4 de Zaporóshe.

Para que a vida de Olena aos 19 anos fosse perfeita, pensavam os seus pais que só lhe faltava casar e trataram então de lhe arranjar marido. “Ele vivia a 1.200 quilómetros de distância, mas vinha a Zaparóshe ver os pais nas férias e, quando entrou na nossa igreja, a minha família olhou pra ele e achou que era mesmo esse”, conta a ucraniana. Em cerca de um ano estavam casados e mudou-se ele definitivamente para a cidade-natal da esposa, que, como ela própria admite, sempre fora “educada para ser uma líder” e não lhe deu alternativa. Correu tudo bem? Não. “Na prática, é como se eu tivesse sido obrigada a casar”, diz ela. “Lá não se podia namorar e conhecer pessoas como se faz hoje, e os nossos pais tratavam de nos arranjar casamento rápido, porque a ideia era ‘ou casas agora, ou depois já és velha e ninguém te quer’”. A conjuntura também não ajudou ao romance. Com o mercado de trabalho em recessão, o casal viveu na mesma casa apenas durante alguns meses porque o marido de Olena perdeu o emprego pouco depois de ela engravidar e só na Sibéria encontrou colocação como motorista de pesados para a construção civil. “Estive sozinha toda a gravidez e ele só regressou cinco dias antes do parto, porque eu lhe disse ‘ou vens agora ou nunca mais’”. Tinham a pequena Alina nos braços, mas já começara a instalar-se entre o casal um certo afastamento, alguma frieza... “É normal. Aos 22 anos, casados? O que é que a gente sabia da vida?”.

Pouco depois também Olena ficava sem emprego. Estava instalada no país “a grande crise”, a escola dispensou 80% do seu pessoal quando as famílias deixaram de poder pagar aulas de música, as alternativas de emprego eram cada vez mais escassas e, um dia, perante anúncios de jornal a promoverem trabalho no estrangeiro, a decisão foi inevitável. Deixando a bebé ao cuidado dos avós maternos, os dois jovens ucranianos decidiam rumar a Espanha e, para obter a documentação necessária e o devido transporte, desembolsaram 2.000 dólares cada um, 600 dos quais para garantir emprego à chegada ao país. “Mas em Espanha assistimos a um assalto muito violento numas bombas de gasolina e achámos melhor continuar viagem”, conta a única mulher nesse grupo de oito ucranianos. “Era noite escura, nem sei onde isso foi, mas viemos para Portugal sem papéis nenhuns e acabámos entre Vila Real e o Peso da Régua, eles nas vinhas e eu como doméstica”.

Assim começava em 1999 a maior aventura de Olena e também a pior fase da sua vida como migrante. No primeiro mês correu tudo bem, até que, chegada a hora de receber o salário, o patrão esqueceu o combinado e lhes descontou 33% para se pagar de estadia e alimentação, deixando cada ucraniano com o que corresponderia hoje a apenas 200 euros. “Os homens começaram a pressioná-lo, a dizer que queriam a legalização e a resposta era sempre que, se não estávamos bem, podíamos ir embora. Mas para onde é que nós íamos, sem conhecimentos e sem falar a língua?”, recorda Olena. Denunciar o empresário às autoridades policiais também não era opção. “Havia muitos ucranianos e russos a cobrarem dinheiro aos emigrantes para lhes arranjarem emprego, nós tivemos que pagar pelo nosso e, se a gente abrisse a boca, ou desaparecia ou aquela máfia vingava-se na nossa família, na que ficou na Ucrânia”.

O grupo de migrantes tentou convencer o patrão por via do diálogo, mas no mês seguinte ele ordenava que todos fizessem as malas e deixava-os na estação de comboio para se irem embora. “Foi o desespero total”, admite Olena, perante a surpresa da filha. Alina está silenciosa ao lado da mãe, ouve-a com aqueles olhos claros e intensos, e confessa: “Eu não sabia nada disto. Estou a ouvir isto tudo pela primeira vez”.

Olena conta então que, nessa altura, já tinha uma irmã a viver em Faro e lhe pediu ajuda: “Ela fazia limpezas na casa de pessoas poderosas, com conhecimentos, e disse logo que ia falar com a Dona Isabel – que eu espero que esteja bem na vida, porque merece”. No tempo da viagem entre a Régua e o Porto, a senhora algarvia tratou de tudo e, à chegada à Invicta, já uma carrinha esperava o grupo de ucranianos para os levar para Ovar e instalar num hotel. No dia seguinte estavam a trabalhar numa fábrica de cerâmica, ao fim de uma semana mudavam-se para uma casa que o patrão lhes cedera, no final do mês o salário era maior e tudo parecia ter melhorado. Mas, após um meio ano, a empresa continuava a negar-lhes o contrato de trabalho e Olena ainda ouvia um sermão de cada vez que apelava à legalização. “O patrão dizia que em Portugal eu tinha que aprender a ouvir e a calar. Durante uns tempos achei que ele tinha razão, mas agora já não concordo. Nós vivemos em democracia, temos liberdade de expressão. Isso é o tipo de coisas em que Portugal ainda parece fechado no tempo do Salazar. Aqui e na Ucrânia, muita gente ainda pensa que a mulher tem que ser submissa. Porquê?”. Olena exalta-se na avaliação e Alina junta-se à mãe: “E não é só nisso das mulheres! Também há muitos problemas se alguém gostar de outra pessoa do mesmo sexo. Eu tenho um amigo que é homossexual e sofre muito porque a família não o aceita!”.

É nesta fase que a história da família Mishtur entra em capítulos mais felizes. O marido de Olena troca a cerâmica pela metalúrgica e ela passa a trabalhar num restaurante de referência em Ovar, o Casinha Júlio Dinis, cujo proprietário até hoje tem a sua gratidão por tudo o que lhe ensinou da cultura portuguesa. “A primeira coisa que o senhor Carlos fez foi pedir a uma empregada que me levasse a uma loja lá perto para me comprar umas calças, porque realmente não tinha jeito nenhum eu trabalhar de saia até aos pés. Ele e a dona Armanda deram-me contrato, pagaram-me a Segurança Social, arranjaram-me uma professora de Português e, duas ou três vezes por semana, eu encontrava-me com ela num café ou ia de bicicleta a casa dela. Ele dava-nos as refeições todas no restaurante – mesmo ao meu marido, que trabalhava fora, mas ia lá jantar connosco – e foi assim que juntámos dinheiro para ir buscar a Alina, que veio para cá aos três anos. E também foi o senhor Carlos que me ensinou a comer de faca e garfo. Na Ucrânia só usávamos colher e, anos mais tarde, quando fui visitar a minha mãe e lhe pedi talheres, ela até ficou ofendida! Achou que eu tinha ficado com a mania!”.

Olena tem essa fase da vida em Portugal bem marcada, reconhecendo-a como a da mudança e aceitação. “Foi tudo uma aprendizagem”, explica. “Eu sofri muito por causa dos ucranianos que faziam asneiras por cá e passava por ser como eles. Era muito difícil ganhar a confiança das pessoas, mas nós não somos todos iguais. Tal como na Ucrânia e na Rússia, em Portugal também há gente muito fraca e a minha sorte, com o senhor Carlos, foi que ele nos deu tudo de que precisávamos: os documentos, a língua, a maneira de viver na sociedade portuguesa…. Ensinou-nos a falar, a saber como nos devíamos apresentar. Deu-me as primeiras calças que eu tive em Portugal e para muita gente isso não interessa, mas a mim tocou-me porque eu nunca tinha sido ensinada assim, com essa sinceridade. É muito importante ser-se sincero com as pessoas e dizer-lhes a verdade, para elas se poderem adaptar”.

Os conhecimentos de Português também iam, entretanto, evoluindo. Olena crescera a falar Russo, mas no seu percurso académico aprendeu ainda Inglês e Espanhol, o que mais tarde a ajudaria a dominar a Língua de Camões, que hoje conhece bem melhor do que o próprio Ucraniano, só adotado como idioma oficial da Ucrânia após esse território se tornar independente da União Soviética, em 1991. Agora é em Português que Olena pensa, é em Português que reconstitui cenários da sua vida quotidiana, que regista memórias, que toma decisões, que fantasia…

Também fora em Ovar que a música regressara à vida dos Mishtur, graças à Dona Rosa, que, além de lhes oferecer casa no Furadouro, empregou Olena como maestrina do coro da igreja local, até que os católicos se ressentiram de não ver a ucraniana protestante partilhar dos mesmos rituais eucarísticos que os colegas e a dispensaram do serviço. Nessa altura já a pianista tentava ver a sua formação musical reconhecida em Portugal, mas o processo de equivalências sempre se revelou “difícil, caro e pouco prático”, ao exigir documentação emitida “numa época em que não havia computadores” e cujos arquivos se perderam na passagem da URSS para a autonomia. A solução foi continuar a trabalhar noutras áreas e foi assim que Olena chegou à antiga fábrica de calçado Lunik, na Feira, para onde se mudou com Alina após a separação do marido. “Começámos então a ter uma vida normal”, diz ela. “Conhecemos boas pessoas, descobrimos bons vizinhos, tínhamos apoio emocional e até financeiro de toda a gente”. Os patrões, Joaquim e António Almeida, ensinaram-lhe tudo o que havia a saber sobre calçado e, durante nove anos, até a empresa encerrar por insolvência em 2015, a coralista frequentou uma série de cursos relacionados com a indústria, o que lhe permitiu chegar a controladora de qualidade numa firma com 215 funcionários e ainda hoje justifica que trabalhe das 08h00 às 17h30 noutra unidade do setor. “Se hoje sei fazer um sapato do princípio ao fim, devo-o a eles”, reconhece.

Na sua lista de motivos para gratidão, Olena poderia acrescentar: “Se hoje dou aulas de piano no Orfeão da Feira, devo-o a um Toyota Yaris”. A mãe de Alina ganhou esse carro num concurso da associação comercial do Porto e a entrega do prémio realizou-se no Café Majestic, cujo piano de cauda deslumbrou a ucraniana que dos 16 aos 23 anos exercitara o teclado todos os dias, às vezes por mais de 10 horas consecutivas. Quando no Porto voltou a pressionar aquelas teclas, arrancou do piano composições impressas há anos na sua memória e fê-lo com tal graça e desenvoltura que impressionou um cliente casual do Majestic, que, ouvindo-a ser identificada como residente na Feira, a convidou a conhecer o Orfeão dessa cidade. Foi assim que a pianista passou a colaborar com a instituição onde, até hoje, já ensinou dezenas de alunos dos 6 aos 82 anos de idade, muitos deles habituados a partilhar a sala com a pequena Alina, que, à saída da escola, se juntava à aula da mãe e aí “fazia os deveres, lanchava e esperava por ela”. A sala de piano é simples e despojada, mas a jovem tem-lhe carinho: “Passei aqui a minha infância”. Viu crianças hiperativas que saltitavam no banco todo o tempo que passavam ao piano, conheceu outras que chegavam stressadas da escola e se deitavam no chão para descomprimir, cruzou-se ainda com as que contavam à mãe dos seus namorados novos ou, em lágrimas, dos namoros acabados. Olena confirma tudo isso. Sabe que, “além de professora, precisava ser psicóloga, amiga e um bocadinho confidente também”.

Isso nunca lhe evitou, contudo, a fama de “ser muito exigente e rígida, e de nunca dar folga aos alunos”. Alina quase se sente justiçada ao ouvir a mãe reconhecê-lo e exclama: “É verdade! Ela nunca está satisfeita, pede sempre mais e, como eu tinha medo dela, queria sempre ter boas notas!”. A mãe ouve-a e também não a poupa: “Eu não tinha razão? Tiveste boas notas porque eu exigi! Entravas com média de 18 na Faculdade de Arquitetura se não tivesse sido assim?”.

Os ex-alunos de Olena não parecem recriminar-lhe o grau de exigência. Alguns deles já são adultos, formaram-se nas mais diversas áreas de atividade e, quando a encontram, oferecem-lhe atendimento privilegiado nas suas novas carreiras. Foi o que aconteceu com um pianista que, agora cirurgião plástico, se ofereceu para corrigir na ex-professora uma cicatriz que ela tem abaixo da linha do maxilar, no lado esquerdo do pescoço. Ela contou a história com ar de graça, num tom de evidente orgulho pelo sucesso do seu ex-aluno e pelo carinho que ele ainda lhe demonstra, e não teria revelado o restante se não lhe perguntássemos a origem dessa irregularidade na sua pele. Responde-nos que a cicatriz é efeito da radiação emitida pelo desastre nuclear de Chernobyl e então percebemos melhor porque fizera questão de nos dizer que “uma coisa muito importante na tradição da Ucrânia” é a forma como, a qualquer hora do dia, a população se cumprimenta com a expressão “saúde para ti”.

Olena tinha 10 anos quando, a 26 de abril de 1986, se deu a explosão no reator da usina nuclear perto da cidade de Pripyat, no norte da Ucrânia soviética, 300 quilómetros a Norte de Zaparóshe. Os efeitos reais dos químicos lançados na atmosfera foram ocultados à população no imediato e, durante anos, continuaram a ser encobertos ou deturpados nas versões oficiais do acidente, pelo que, embora atualmente se saiba que as repercussões radioquímicas do desastre afetaram e continuarão a afetar dezenas de milhares de pessoas ao longo de séculos, motivando malformações congénitas e uma elevada incidência de cancros em muitos territórios ex-soviéticos, em 1986 a vida continuou a decorrer sem cautelas especiais na região a Sul de Chernobyl.

“Durante os três meses do Verão nós passávamos a vida dentro do rio. Éramos crianças e isso era natural”, lembra Olena. “O que não sabíamos é que a explosão contaminou as águas do rio, que foram deslizando sempre até às margens onde nós tomávamos banho, e eu fui uma das primeiras a ser afetada na minha zona: apareceu-me uma bolha enorme na cara, doía muito, mas eu pensava que era dor de dentes”. A menina pianista foi operada pela primeira vez aos 11 anos e esteve “com a ferida aberta dois meses”, enquanto os profissionais de saúde tentavam encontrar para o problema uma justificação que não envergonhasse o governo soviético. “Fui levada, sem exagero, a umas 10 cidades – Moscovo, São Petersburgo, aquelas com hospitais mais conhecidos – e fiz radioterapia e quimioterapia em comprimidos, por ser ainda criança. Mas perdi dois dentes, o osso do maxilar já tinha apodrecido e tiveram que substituí-lo por uma placa. Se calhar eu já tinha células cancerígenas e por isso é que as consequências foram tão rápidas… Mas de 10 em 10 anos continuo a fazer raios-X e a enviá-los para a Ucrânia”, para uma avaliação médica que parece não constar dos registos oficiais de vítimas daquela que foi a maior catástrofe nuclear civil na história da humanidade, com uma radioatividade equivalente a mais de 200 bombas atómicas como a que fez tombar Hiroshima. Há quem diga que a ignorância é uma bênção e se calhar é isso que explica que Olena não tenha cicatrizes psicológicas dessa fase da sua vida: “Na altura, o Governo escondeu-nos tudo porque não queria admitir que isto era efeito da radiação. Só em 2019, ao ver a série ‘Chernobyl’ na televisão, é que eu percebi realmente o que se passou.”

Alina ouve tudo em silêncio, observa Olena muito séria e concorda que a cicatriz é para manter. Diz que só tem a agradecer à mãe por ter deixado a Ucrânia na mesma idade que ela, a filha, tem agora e num tempo tão diferente do atual, que exigia bravura sem o reconforto de internet, telemóveis ou GPS. “Valeu a pena e ela fez bem em vir para cá. Quanto mais não seja porque ao menos eu ainda não estou casada aos 20 anos”, atira, com riso.

Para tudo ser perfeito, às Mishtur só falta experimentar um Natal português. Convites houve vários, ao longo dos anos, mas Olena sempre os recusou por achar que a sua presença seria uma imposição pesada num momento de estrita reunião familiar. Tanto que aprendeu sobre Portugal e a eloquência lusa, e falta-lhe apreender que essa intromissão seria genuinamente bem-vinda… Alina parece mais consciente desse traço da hospitalidade nacional, insiste que preferia um Natal português a uma viagem pela Europa e agarra o braço da mãe a tentar convencê-la, feita menina que volta a pedir brinquedos. A meio tom entre o aviso e a súplica, deixa no ar que, se a Dona Eduarda voltar a convidá-las, este ano dizem-lhe que sim. ■

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